A Semana



A culpa é do mosquito (Rogério de Moura)

Um clima de apreensão se instalara no salão principal do Palácio Imperial: a
princesa assinaria a Lei que libertaria escravos brasileiros e africanos. Definitivamente,
seria o ponto final no escravagismo oficial de humanos no planeta.
Foi assim, naquele dia histórico de 13 de maio de 1888 que a alegria em sensações
de liberdade tomou conta das ruas do país. Era uma enorme população de negros, pardos
e mulatos festejando com música, dança e cachaça a chegada dos tempos positivistas.
Milhares de senhores de engenho perderam o direito à exploração humilhante da
força de trabalho daqueles seres humanos desfavorecidos. Realmente os tempos de
liberdade chegaram e com ele o direito de ir e vir se instalou na vida de cada cidadão
brasileiro. Só faltou um pequeno detalhe à população alforriada: o acesso ao poder
econômico, tão enaltecido pelo advento irreversível do capitalismo. E no dia 14 de maio
de 1888, quase 4 milhões de ex-escravos foram abandonados nas ruas, a qualquer sorte,
naquele “Dia Nacional do Desemprego”.
Lixeiras sociais se formaram em torno dos centros urbanos em forma de favelas,
ruínas e cortiços, por toda parte — a discriminação instalou-se, veladamente. Estrangeiros
de todas as partes ocuparam as lavouras; nas indústrias que aqui se implantavam, os
postos de trabalhos foram destinados aos mais validos e seus filhos, e os desvalidos foram
destinados à fome, à miséria.
Pelo mundo, havia Leis que proibiam a miscigenação, e a discriminação racial
legalizada se instalava por toda parte. Uma missão estrangeira, vinda da Europa, visitou
o País com o objetivo de impedir ao povo mestiço o acesso ao capital. E entre jantares e
almoços, convenceram Sua Majestade D. Pero II a aprovar a lei de discriminação, usando
como argumento que o MESTIÇO era mais fraco que a raça pura, e que adoeciam com
facilidade e morriam de gripes e febres.
E assim, o Imperador já estava por assinar o Decreto quando, foi interrompido por
um grupo de médicos sanitaristas, entre eles Haddock Lobo, que o demoveram da ideia,
com o seguinte argumento:
— Não, majestade! Não é a miscigenação que mata o mestiço. É o mosquito,
transmissor de doenças, que infesta o lugar onde ele mora. Basta combater o mosquito e
dar oportunidade aos compatriotas “mulatos”, que este país se transformará numa das
maiores potências mundiais!
E assim, graças aos nossos mosquitos, somos um país em franco crescimento.
Ufa! Ah! Se não fosse o mosquito…
Agora só nos falta a “mosca branca” da educação.

Redação

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